Tecnologias de Convivência com o Semiárido aumentam a expectativa de alta produtividade no campo

Céu cinzento, ainda carregado de nuvens e, no caminho, a água a escorrer na terra molhada. Sinais de renovação e resiliência. Caiu água no sertão! Foi atravessando as enxurradas que começou mais um dia de trabalho com visitas técnicas e acompanhamento de ações de Convivência com o Semiárido, possíveis a partir das lutas dos povos do Semiárido pela vida digna no campo.

No caminho, da janela se via a vegetação da Caatinga, tingindo de verde a paisagem e renovando as folhas das plantas resistentes da região. Também é de se admirar as tecnologias sociais (como tanques e barreiros) que se avolumam com a água da chuva trazida pelas enxurradas. É comum ver as crianças tomando banho na chuva e agricultores/as que correm no terreiro para abrir o ‘sangrador’ da cisterna que já transborda.

Foram cerca de 40 km percorridos da sede do município de Jacobina/BA à comunidade Inchu em Caém/BA, para chegar à propriedade da família de Heliana Andrea Gomes e Gidiel Borges, que está participando do Programa uma Terra e Duas Águas (P1+2), criado pela Articulação Semiárido Brasileiro (ASA). O Programa tem como objetivo fomentar a construção de processos participativos de desenvolvimento rural no Semiárido brasileiro, promovendo soberania alimentar e nutricional, bem como, geração de emprego e renda entre as famílias agricultoras, com manejo sustentáveis da terra e da água para a produção de alimentos.

Em meio a labuta do dia a dia, Heliana recebeu com entusiasmo técnicos do Movimento de Organização Comunitária (MOC) – organização de assistência técnica que está acompanhando em Jacobina e Caém as ações do P1+2 com parceria da Cooperativa de Trabalho e Assistência a Agricultura Familiar Sustentável do Piemonte (COFASPI) – e demonstra ansiedade para ver a cisterna calçadão pronta. Na propriedade da família de Heliana já foi realizado diagnóstico da unidade produtiva e dessa vez os técnicos retornaram para fazer o cadastro de fomento produtivo.

“Meninos, óia a chuva! Eita é tanta água indo embora. Não vejo a hora de ver minha cisterna pronta e cheia pra eu plantar minhas hortas e criar meus bichos”, afirma a agricultora.

Heliana aos 10 anos de idade deixou a terra natal, Caém, e foi para Salvador/BA. De lá seguiu para São Paulo em busca de melhores condições de vida. Passou trinta anos na terra da garoa e agora está de volta às suas origens, ao perceber que é possível viver bem no Semiárido, com a conquista de políticas públicas e sociais que são de direito das famílias e povos da região.

“Já tem três anos que ‘tamo’ morando aqui nesta casa. Logo que cheguei achei muito diferente e ainda não sabia como reconstruir a vida aqui. Agora, acho até que já rejuvenesci a base de uns dez anos, longe daquela agonia da capital. Aí, batendo papo com os vizinhos tomei conhecimento desses projetos. Oxe, é bom demais. Ainda dá oportunidade de a gente fazer cursos, aprender (…)”.

Juntamente com o esposo Gidiel Borges e três dos filhos, Heliana já cultiva hortaliças e cria galinhas para o consumo da família. A partir do Projeto P1+2, a família pretende ampliar as hortas agroecológicas com os canteiros produtivos, construir galinheiro e criar porcos, fazendo investimentos do projeto produtivo do P1+2, que visa contribuir para a que as famílias alcancem autonomia com o trabalho que desenvolvem aproveitando os potenciais da propriedade.

“Eu vou criar é uns porcos. É um bicho bom porque cresce rápido, logo a gente vê o rendimento. Aí quando a cisterna tiver pronta vou plantar muitas leiras nos canteiros para comer e para vender também. É bom ter um coentro fresquinho no quintal para temperar a panela, né? Vou criar mais galinha, que aí a gente vende, come o ovo, e no dia que não quiser comer ovo a gente vende também”, expressou Heliana.

Programa – Por meio de contratos firmados entre organizações de assistência técnica com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), mais uma etapa do P1+2 está sendo realizada, com cursos, implementação de tecnologias sociais e investimentos nas unidades produtivas familiares. O P1+2 foi criado pela ASA, em 2007, com o intuito de ampliar o estoque de água das famílias, comunidades rurais, e populações tradicionais para suprir as necessidades dos plantios e das criações animais.

 Políticas – Programas de acesso a tecnologias sociais estão ameaçados na região Semiárida. Foram feitos cortes de recursos, em 2017, durante o Governo de Michel Temer, reduzindo o acesso das famílias a projetos essenciais para garantir direitos básicos e que viabilizem a permanência das famílias no campo. Assim, movimentos sociais pelos povos do campo e da cidade seguem organizados e resistem contra os retrocessos sociais, principalmente no momento de conjuntura política em que o cenário para 2019 é de um executivo nacional de ultradireita e um Congresso Federal ainda mais conservador

Texto: Ediane Bispo – Comunicação MOC e COFASPI

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